Os Rótulos, Assumidos, de Jean-Michel Mabeko-Tali – Parte II – O “Descasque” das 13 Teses
O meu propósito será essencialmente o de reexaminar o contexto histórico em que, por um lado, se afirmou a personalidade política pública de Nito Alves, e, por outro, se estruturaram e formularam as ideias que deram origem a esse texto em todo o caso indubitavelmente histórico. Tratar-se-á de fazer uma exegese da teleologia político-ideológica desse texto que, na minha opinião, constitui o legado político do seu autor, independentemente do julgamento que se faça do seu conteúdo intrínseco.
(em Rótulos Atribuídos, Rótulos Assumidos: Memórias e Identidades Políticas em Angola – Da Luta Armada Anticolonial ao 27 de maio de 1967(1960-1977), páginas 126-127)
Parte II – O “Descasque” das 13 Teses
Introdução
Pensei que o professor Jean Michel nos brindasse com uma interpretação ou explicação crítica de cada uma das 13 teses do documento histórico que Nito Alves apresentou ao Comité Central (C.C.) do MPLA, em sua defesa em fevereiro de 1977, quando sujeito a um inquérito que tardava. Tal descasque dos argumentos ou factos apresentados por Nito Alves, não surgiu, e o autor deu-nos sim uma abordagem subjetiva, centrada em aspectos psicológicos, como que “adivinhando” as “frustrações”, “pensamentos”, e mesmo fins ou propósitos inconfessados da personalidade de Nito Alves, que, o teriam conduzido à escrita das referidas teses e a outras acções. Assim, o professor, seleccionou cirurgicamente alguns trechos das teses, assumindo um pouco o papel do psicanalista que sentou no seu divã um guerrilheiro, chegado da mata, encerrado nos seus medos e sofrimentos resultantes da martirizante longa noite colonial que o chamado “ocidente” perpetuou enquanto pôde.
Para os leitores menos informados dos acontecimentos da época, convém esclarecer que, o estigma “fraccionista”, foi usado indistintamente pelo MPLA desde 1960 até 1977 fossem quais fossem as ideias pessoais, de tendência ou mesmo de grupo, como marca definitiva de exclusão e em inúmeras ocasiões, de morte.
Nito Alves e José Vandunem, em plena reunião do comité central em outubro de 1976, foram acusados de dirigirem uma tendência fraccionista, um tal “segundo MPLA”, mas sem que, as “ditas provas” fossem ali arroladas. Sem discussão e em último recurso, por proposta de José Vandunem, o C.C. criou a tão falada “comissão de inquérito ao fraccionismo” (dirigida por José Eduardo dos Santos, membro do B.P. do MPLA) que teve dois meses de prazo para apresentar um relatório em âmbito restrito do C.C. (até 8 de janeiro de 1977). Como ainda não tinha sido ouvido até fevereiro de 1977 (decorriam já 4 meses), Nito Alves, escreve então uma carta ao CC do MPLA e uma outra à referida comissão de inquérito, informando que, usando o direito de defesa que lhe era conferido pelo artigo 14 da lei de Disciplina do MPLA, e em virtude de ainda não ter sido ouvido e face ao sigilo pretendido pelo C.C., ter transbordado para os organismos de massas, comissariados provinciais, comissariados políticos das FAPLA e assembleias de militantes, iria então distribuir a esses organismos um documento de defesa intitulado “13 Teses em minha Defesa”. Estas duas cartas constam logo no início do documento. Se a dita comissão fez algum relatório, o mesmo nunca foi divulgado.
O que não foi dito pelo Professor Jean Michel Mabeko-Tali
1ª Tese – Método Dialéctico e Método Metafísico
Tendo como base as decisões da III Plenária do Comité Central de Outubro de 1976, que assumiu o Marxismo-Leninismo como guia para a acção, Nito Alves, reclama o uso do método dialéctico na análise das acusações que lhe são feitas, recusando a utilização do método metafísico usado pelos seus acusadores, que lhe exigem respostas de sim ou não, não perspectivando os factos arrolados, no tempo e no espaço, pretendendo antecipar conclusões não demonstradas.
2ª Tese – Antecedentes Históricos
Aborda o clima de ausência de coesão interna e de filisteísmo de grupos e famílias, sentido pela 1ª Região, aquando do acidentado e fracassado Congresso de Lusaka, em 1974 (seguido da Conferência Interregional de Militantes CIRM). Ali, Lúcio Lara e certos dirigentes deram-lhes explicações confusas e ambíguas relativamente às acusações “essenciais” feitas pela Revolta Activa (R.A.) ao Camarada Presidente, persuadindo-os de que, eram verdadeiras e criticando apenas a “forma” das mesmas. Nito Alves defendeu ali, a flexibilidade da táctica, mas a intransigência quanto aos princípios essenciais e aos objectivos finais; o julgamento inadiável de todos os traidores da revolução, o rompimento com o revisionismo e reformismo e uma consequente direcção marxista-leninista que idealizaram no quotidiano da guerrilha da 1ª região. Separaram-se depois cada um para a sua frente de combate. Caracteriza aquela fase, após a chegada da delegação chefiada por Lúcio Lara do seguinte modo:
- Incapacidade e fraco poder de direcção político-revolucionária.
- Confusão entre estratégia e táctica.
- Ausência total de teoria acabada para cada fase.
- Afluxo de muitos e novos elementos para o MPLA.
- Incapacidade e fraco poder organizativo.
- Impotência para enquadrar novos membros o que levou a sistemáticos desvios à direita e à esquerda.
- Erro do C.C. ao alargar o 2º plenário aos Comités Amílcar Cabral (CAC) e similares e constituir a Comissão Directiva de Luanda nessa base.
- Tomada de posição vertical sobre o Poder Popular apenas pelo Camarada Presidente.
Faz também referência a uma conferência de imprensa em que Lúcio Lara, assume segundo ele uma posição capitulacionista, afirmando que todos os movimentos lutavam pelo mesmo objectivo, a Independência Nacional, defendendo uma política de unidade com os fantoches e não já de compromissos apenas transitórios. Termina dizendo que a vida do MPLA girava, nessa altura em torno dos seguintes factores:
- O Camarada Presidente
- A 2ª Guerra de Libertação Nacional
- O entusiasmo espontâneo das massas, da bandeira e dos crachás.
3ª Tese – O que é ser Vanguarda
Nesta tese, Nito Alves afirma que muitos dirigentes apenas consideram vanguarda a elite da luta armada e da clandestinidade e têm um conceito de vanguarda centrado no paternalismo, elitismo e dirigismo, sendo que para estes a vanguarda é apenas o C.C. e o B.P., a quem é reconhecido o direito anti Leninista de decidir fora das massas, fora da opinião dos grupos de acção, dos comités que já existem. Afirma que o secretário administrativo do CC se faz passar por secretário-geral do MPLA, o que viola os estatutos, já que esse cargo não existe, e ao fazê-lo, viola o centralismo democrático, abandona a democracia interna e os métodos colectivos de direcção. Critica os métodos artesanais de trabalho que conduzem à centralização do mesmo nas mãos de uma burocracia. Defende que a vanguarda (partido marxista-leninista) deve emergir de toda a massa militante e não apenas dos dirigentes e responsáveis. Fala ainda da liberdade de discussão e da unidade da acção que pressupõe o reconhecimento da necessidade de organização e de estudo dos dossiers. Termina referindo que a disciplina vem sendo apenas aplicada quando é para afastar militantes de esquerda e que, a imagem que se vai dando é como que a do Sr. feudal no seu feudo.
4ª Tese – Unidade Nacional
Sendo acusado de afastar a pequena burguesia da frente anti-imperialista, Nito Alves afirma categoricamente que esta classe social constitui uma força a considerar como aliada. Refere, no entanto, que, é exactamente a pequena burguesia burocrática, a classe que está pronta a servir os interesses monopolistas e que, por isso, a unidade nacional não pode impedir a luta de classes, ou seja é indispensável colocar a pequena burguesia ao lado dos operários. Conclui, dizendo que espera que a pequena burguesia se desembarace dos aspectos negativos da sua prática nesta etapa de ditadura democrática revolucionária, aderindo à revolução.
5ª Tese – O Anti-Sovietismo – arma da contra-revolução
Nesta tese Nito Alves não poupa Lúcio Lara. A dado momento afirma “Pode-se falar com segurança que existe, de facto, uma corrente ideológica encabeçada pelo secretário administrativo do B.P. no seio do MPLA, de conteúdo essencialmente anti-soviético“, o que o professor Jean Michel deixa agora transparecer também no seu novo livro de uma forma mais objectiva do que anteriormente o fizera. Para citar apenas alguns dados ali apresentados: Nito Alves divulga o que Lúcio Lara lhe disse em Brazzaville, em agosto de 1974, sobre o comportamento “simples” e “excepcional dos Chineses” em contraste com o dos soviéticos “ostentosos”. Conta igualmente como Lúcio Lara tratou estudantes militantes, chegados da União Soviética em 1976, aonde estudaram na escola do PCUS, convidando-os a retomarem apenas os antigos empregos e ameaçando-os de que já tinham expulsado do Comité Director um camarada – Paiva – porque ele tinha a mania de ser “pró-soviético”. (isto quando havia forte carência de quadros). No tocante à escola do Partido diz que a mesma não avançou pois Lúcio Lara não encontrou nenhuma fórmula de o fazer sem os professores soviéticos. Também afima que o grande protector da corrente maoista e social-democrata, no interior do partido, é Lúcio Lara, já que este os vê como aliados no seu profundo ódio à União Soviética, sendo que o anti-sovietismo é uma variante do anti-comunismo. Nito Alves não compreende como é que se pode estreitar relações com a URSS tendo como secretário administrativo do BP um anti-soviético. Nesse rol de alianças protagonizadas por Lúcio Lara, ainda faz referência a uma carta convite da Internacional Socialista onde o convite se pretende protagonizado em Lúcio Lara ao arrepio das normas de delicadeza e decoro, e afirma; estranho convite este! O entendimento de Nito Alves é de que Lúcio Lara ocorre num desvio de direita ao defender a aliança entre os sociais-democratas e os maoistas.
6ª Tese – A CIA e a Revolução angolana
Considera que a CIA está por trás da desestabilização do processo revolucionário angolano, tal como já o fizera em Cuba, Chile, Sudão e muitos mais palcos da revolução, fazendo-o através da calúnia como arma política.
Como vê Nito Alves a preparação desse golpe da direita em Angola:
Através de uma campanha de calúnias lançada pelo Jornal de Angola destilando ódio contra os militantes e massas populares que combateram na 1ª Região do MPLA, bem patente nos editoriais a partir de janeiro de 1976, sendo que, o momento mais alto da injúria terá sido a publicação do poema “A ti Chefe“, de Hélder Neto, homem forte da DISA, confundindo as massas e defendendo a ideia de que Nito era anti Neto. Traça também ali o perfil de Costa Andrade, Ndunduma em total consonância no anti sovietismo com Lúcio Lara. Ainda indica quem na Televisão Popular de Angola (TPA) e na Rádio Nacional (R.N.) estava ao serviço dessa campanha contra ele escrevendo editoriais a difamá-lo. Nesta Tese, aborda o papel de Mendes de Carvalho, através do Departamento de Organização de Massas (DOM) Regional, como a personalidade que congrega e encabeça, numa base regionalista-tribalista, um certo número de cidadãos e patriotas que efectuaram para esse fim uma reunião, no dia 12 de julho de 1976, na Rua Eça de Queirós, casa nº30, da qual apresenta uma cassete.
De seguida Nito Alves detém-se pormenorizadamente sobre o tal “fantasma do golpe de estado” preparado através dos agentes reaccionários da máquina da Direcção de Informação e Segurança de Angola (DISA). Para tal, apresenta cópias de relatórios feitos por vários agentes da DISA, dirigidos ao chefe Ludy (documentos que constam da 6ª Tese). Os agentes citados são; um tal cujo nome de código é MARÇAL I; outro é Alípio Neves da Costa e ainda Simeão Kafuxi. Nito Alves refere nesta tese que, Hélder Neto era dos CAC e que, enquanto responsável da DISA-INFANAL, em conluio com Tatão, também dos CAC, fez tudo para destruir o dossier CAC elaborado por quem conhecia os CAC por dentro, como forma de os ilibar. Aborda a acusação feita a Pepetela de pertença aos CAC e afirma que esta acusação foi travada por Hélder Neto, com o apoio de Lúcio Lara e Dilolwa. Faz ainda referência, nesta tese, a um documento com o título Relações Brasil/Angola distribuído por Lopo do Nascimento, no B.P. do MPLA, em que a dado momento na pág.3 se refere, sobre a saúde precária de Agostinho Neto o seguinte, … “o seu desaparecimento deveria se dar no momento em que a divisão entre moderados e radicais estivesse estabelecida.”, o que, para Nito Alves, traduzia a existência de um objectivo claro da CIA no desaparecimento físico do Presidente Agostinho Neto. Julgo importante este excerto das teses (pág. 104-105, 13 teses em Minha Defesa-Nito Alves, Edições Elivulo, 2021)
…”Camarada Presidente
Camaradas do Comité Central
É preciso não entreter a Nação com “divisionismos”, “fraccionismos” e coisas do género de que sou acusado, é preciso abandonar esta aberração de preconceitos doentios, porque o perigo da revolução está à vista. É o perigo real de um provável e futuro golpe de estado militar de direita, o que acontecerá se o Comité Central não assumir a sua responsabilidade. A táctica e a técnica da CIA é sempre a mesma: provocar a esquerda, atribuir-lhe a responsabilidade de assassinatos, montar uma campanha de desinformação nos mass media. Diga o que se disser, nós vemos, claramente visto, com os nossos olhos, todas estas manobras e manipulações da CIA. Qualquer dia, a cidade de Luanda acordará com tiros, como já puseram mais de uma vez de prevenção as unidades estratégicas dos quartéis de Luanda e Lubango, e atribuirão tudo isto ao fantasma do “Grupo Nito”. Eis as manobras da CIA.” …
7ª Tese – Como iludir o Povo
Nessa Tese, Nito Alves, começa por abordar a questão do racismo, recusando terminantemente as acusações que lhe são feitas, já que, assumindo-se claramente como marxista-leninista este posicionamento, e o racismo, excluem-se mutuamente. Também refere que a direita do MPLA não está interessada em combater o racismo, usando essas palavras de ordem como capa protectora, pois na vida real está a fazer o racismo enquanto esgrime acusações aos anti-racistas. Retoma o tema da organização para explicar que os comités de acção, em Luanda, dos sectores operário, função publica e privada, estudantes e intelectuais, bairros e camponês- queixam-se do permanente do bloqueio dos seus relatórios pelos actuais responsáveis do DOM Regional (Beto Van Dúnem e Mendes de Carvalho) que, embora informem que aqueles seguiram para a comissão directiva, tal se revela completamente falso. Nito Alves diz que no plano prático da organização, o MPLA é apenas o membro do CC e do BP, Lúcio Lara e correntemente se diz entre os militantes que “quem manda no MPLA é o Lara“. Desenvolve considerações teóricas sobre o centralismo democrático na organização referindo que o mesmo não é aplicado. Ainda aborda a perseguição feita ao seu livro de poemas procurando antagonizá-lo com o Camarada Presidente. Tudo isto para iludir o povo.
8ª Tese – A importância do estudo da Teoria
Nessa oitava tese, Nito Alves faz um apelo ao estudo da teoria, especialmente aos membros do Comité Central do MPLA, afirmando que “em qualquer movimento revolucionário, as forças conservadoras, quando dominam determinadas posições importantes na vida política do País, tudo fazem para menosprezar a importância da teoria. Apresentam o estudo da teoria como actividade própria dos esquerdistas, como se fosse monopólio dos esquerdistas e não dever dos revolucionários”. Afirma depois que a circular nº1 é um documento anti estatutário já que, preconiza organismos do partido por sectores, o que conduz à exacerbação das contradições de classe no seio do próprio movimento de libertação nacional e consequentemente apelida a sua implementação como um desvio de esquerda. As críticas vão dirigidas ao secretário administrativo do B.P., já que, foi ele o promotor da implementação desse modelo organizativo proposto pelos CAC. Faz ainda referência a uma ocasião em que, numa palestra, relativa à análise das classes sociais em Angola, em 1975, na biblioteca Nzinga Mbandi, Lúcio Lara se insurgiu contra a essência do tema e afirmou que a “análise” não passava de uma forma estereotipada, “importada”, e que nada reflectia da realidade angolana, onde a questão de classe não estava nada definida. Termina considerando que o atraso da teoria pode prejudicar irreparavelmente a causa do partido, a classe operária e as massas laboriosas.
9ª Tese – A propósito da opção socialista
Nito Alves vê o MPLA como um movimento de democratas revolucionários em que o conteúdo da posição desses democratas revolucionários muda à medida que se realizam as tarefas das diferentes etapas. Assim, acontecerá inevitavelmente que algumas forças não se venham depois a assumir defensoras dessas novas tarefas revolucionárias em etapas posteriores. Defende nesta tese que, os democratas revolucionários, podem assegurar a passagem dos países libertados para uma orientação socialista, desde que a sua organização se transforme do ponto de vista político e ideológico o que, permitirá conduzir até ao fim a etapa democrática e criar condições para elevar o processo revolucionário a um grau superior, assegurando a vitória das tendências anti-capitalistas. Porém, considera que o MPLA se estava a atrasar a organizar um partido marxista-leninista já que Angola reunia condições de realizar essa transição, não só porque tinha um proletariado numeroso como tinha saído vitoriosa de duas guerras de libertação nacional.
10ª Tese – Um partido Leninista ou um partido Social-Democrata-Maoista?
Nito Alves começa por defender a constituição de um partido Leninista, com base no centralismo democrático, na direcção colectiva, na unidade de acção e vontade como leis incontornáveis na teoria e na prática revolucionária. Insurge-se pelo facto de as estruturas funcionais do MPLA (DIP; DOP; DOM; Jornal Vitória é Certa (VC)), que sendo o sistema ósseo e muscular do movimento, estarem dominadas por elementos esquerdistas, maoistas que ali destilam o seu ódio à União Soviética. Procura delimitar bem os campos em contradição no interior do MPLA nesta fase prévia do congresso. A explicação para a interrogação do título da tese, reside no facto de que, Nito Alves vê que no MPLA não é combatido o oportunismo de direita e a fraca capacidade de análise teórica. Vê também a confusão de conceitos entre esquerdismo e maoismo, como podendo conduzir o movimento para um estilo artesanal de trabalho em que surja em vez de um partido Leninista uma amálgama de direitistas com sociais-democratas e maoistas que se juntarão numa linha oportunista contra os defensores de um partido marxista-leninista. Nessa situação, para ele, era inútil e demagógico continuar a falar em partido marxista-leninista.
11ª Tese – Análise global do 3º Plenário do Comité Central
O significado dos 5 minutos que entraram na história do MPLA- teses em confronto
Resumindo o que aconteceu no Plenário, Nito Alves, enumera os temas destacados abaixo como sendo aqueles em que surgiram claramente duas posições, concluindo que, apesar das divergências, todos votaram as resoluções formais de tipo marxista-leninista. Para ele a “santa aliança entre a direita e os maoistas” adoptara nesse documento apenas a frase revolucionária para não se desacreditarem perante as massas:
Questão da Organização
O significado dos 5 minutos, foi o período que decorreu entre a abertura da sessão pelo Camarada Presidente e o momento para passar ao ponto seguinte, ou seja, houve 5 minutos de silêncio, em que ninguém interveio sobre o tema da organização, e o Camarada Presidente passou imediatamente ao ponto seguinte. Refere ainda a apresentação no plenário de um documento intitulado “Análise do Movimento de Organização“, documento esse que elencava todo um conjunto de “mentiras escandalosas e grosseiras”,… “propositadamente apresentado como pretexto na intenção de se provar que o Secretariado do DOM Nacional-que constituí com o aval do camarada Presidente-era o pai do «fraccionismo», era o instrumento da criação de um fantasma, o «segundo MPLA»”
Unidade no seio do MPLA
Nito Alves face à acusação de sectarismo, que lhe foi feita por Onambwe, bem como por Pacavira, (que apelida de “digno representante do nacionalismo estreito”), apresenta os seus argumentos de defesa e acusa “o actual membro do CC, Manuel Pedro Pacavira de ter sido um dos fundadores do jornal da PIDE/DGS, Tribuna dos Muceques, colaborando activamente na elaboração completa daquele jornal fascista.” De grande relevância, a meu ver, para a análise das teses a referência que Nito Alves faz a uma exposição apresentada à 3ª Plenária pelos comités do «Processo dos 50» e «4 de fevereiro» em que estes dizem haver desrespeito pela linha política do MPLA “em consequência do aparecimento de uma linha ideológica que considera a luta de classes como aspecto fundamental para a instauração da democracia popular.”
Também fica claro que o pedido de suspensão de Nito Alves, do CC e do Governo foi apresentado por Manuel Pedro Pacavira, que segundo diz Nito Alves pede que ele seja enviado mesmo para fora do país, porque “a presença do camarada Nito Alves em Angola não nos permite estar em paz”, posição que o Camarada Presidente repudiou afirmando «que forças sociais estariam interessadas no afastamento e suspensão do camarada Nito quer para fora de Angola, quer em relação ao comité Central ou ao Governo»
Poder Popular
Ainda explana largamente nesta tese sobre a aplicabilidade do Poder popular e sobre a desconfiança política em relação ao poder popular, tendo sido criticado por ter levado a cabo eleições populares em Luanda.
Ditadura Democrática Revolucionária
Aqui Nito Alves trata pormenorizadamente o debate travado em torno dessa designação ocorrido entre Saidy Mingas e José Vandunem.
12ª Tese – Causas reais das divergências
Nesta tese Nito Alves sustenta teoricamente de forma detalhada as causas das divergências que atribui a questões, filosóficas, no plano ideológico, organizativo e disciplinar, mas faz grande referência à dualidade de critérios praticada pelo CC do MPLA em relação aos oponentes no debate. Para uns tudo é permitido, para outros tudo ou nada são argumentos de desvio, perseguição e prisão.
13ª Tese – O Verdadeiro Veredicto
Os apelos de Nito Alves ao Camarada Presidente Agostinho Neto e ao Comité Central, estão em cada página, carregados de grande sentimento de injustiça, genuinamente sentida. Apresenta um grande número de alertas em relação a um possível envolvimento da CIA numa tentativa de aniquilamento da Revolução Angolana. Nito Alves reclama justiça aos seus camaradas do CC e procura sistematizar um caminho que supere os problemas do momento. Nessa perspectiva, a concluir, apresenta ao CC as seguintes medidas revolucionárias para superarem vitoriosamente a situação daquele momento:
1º– Considerar que o anti-sovietismo é contrário ao marxismo-leninismo e que representa uma expressão clara de anti-comunismo, sendo por isso um denominador comum da social-democracia e do maoismo.
2º– Iniciar um combate teórico implacável na organização, desde o BP, CC e organismos de base às manifestações desses desvios descritos no ponto 1º.
3º– Constituir um Comité Revolucionário de Direcção Político-Militar, que substitua de imediato o BP e que tome medidas para o cumprimento dos 1º e 2º pontos por forma a garantir a direcção revolucionária do processo histórico Angolano.
4º– Promover a realização de uma Conferência Nacional Preparatória do Congresso do MPLA, endossada ao Comité a criar conforme ponto 3º
5º– Considerar que o Congresso garantirá a depuração dos elementos que não se enquadram num partido de vanguarda da classe operária baseado no marxismo-leninismo tendo em vista a defesa da revolução e a construção do socialismo.
6º- Convocação urgente de uma reunião do CC alargada às Comissões Directivas Provinciais num período de 60 dias após a entrega deste documento.
A concluir direi apenas que, face ao manancial de informação que está arrolada por Nito Alves nas 13 teses, é muito redutor apresentar um resumo das mesmas num artigo deste género, pois torna-se fastidioso para quem o lê. Porém, espero ter conseguido apontar algumas questões-chave que o professor Jean Michel não considerou abordar no seu livro. Concluirei concordando com ele no seguinte “Certamente que o «fenómeno» Nito Alves continuará sendo ainda um quebra-cabeças para algumas gerações do MPLA e dos Angolanos em geral, quanto ao lugar que se lhe deve dar na história tanto do MPLA como do país. Afinal os efeitos que resultaram tanto da sua actuação política, como da repressão desta pelo seu próprio partido, a seguir ao 27 de Maio de 1977, ainda se fazem sentir na vida sociopolítica angolana para que ele continue ocupando um lugar de destaque no debate político nacional” (em Rótulos Atribuídos, Rótulos Assumidos, pág. 292)
José Fuso
25 de Outubro de 2023
in Novo Jornal