Angola 27 Maio: Na prisão, todos os dias pensava que ia morrer – sobrevivente
Lisboa, 22 Maio (Lusa) – José Reis esteve preso mais de dois anos, após o alegado golpe de Estado de 27 de Maio de 1977, em Angola. Foi espancado, torturado e todos os dias pensava que ia morrer.
Foi detido a 30 de Maio e esteve com mais dez ou 11 colegas, todos nus, num pátio nas instalações da polícia de segurança do Estado (DISA), prestes a ser fuzilado. Foram salvos pelo director-geral, Ludy Kissasunda, que deu ordem para que os levassem para a cadeia de São Paulo.
Seguiram-se mais seis meses de horror. “Ouvíamos os outros a serem torturados. Todas as noites levavam pessoas que regressavam mais mortas que vivas. Alguns não regressavam”, recorda. “Um dia chamaram-me à noite, disseram- me para assinar um documento a afirmar que era português e deixavam-me sair de Angola. Recusei”, diz, com orgulho. Trocou a liberdade pela ideologia que defendia.
“Cumpri escrupulosamente os estatutos do partido e fui penalizado por isso”, refere para justificar que o 27 de Maio não foi um golpe de Estado “mas um contra-golpe”. “O golpe já estava a ser feito há muito tempo pelos maoístas, que criavam um clima de ódio contra os que defendiam a ideologia marxista-leninista”, explica. Face a este clima, quando foi preso, sabia que era “por muito tempo”. “Até deixei o relógio em casa”. O seu nome consta na declaração do Bureau Político do MPLA sobre “a tentativa de golpe de Estado” como “coadjuvante” dos líderes. Garante que “nunca soube de plano nenhum” e que a sua actividade se limitava aos “grupos de acção na universidade”. Era estudante de medicina. Recorda o dia 27 de Maio de 1977 como um dos piores da sua vida. Tinha 22 anos. O seu prédio foi atacado, porque, só mais tarde soube, tinha como vizinho o chefe da DISA para a zona de Luanda.
Saiu com a mulher para casa de uma amiga, onde ficou dois dias. Começou a ouvir as notícias pela rádio. O segundo discurso de Agostinho Neto, então presidente de Angola, “foi terrível“. Disse que não haveria “contemplações” para com os fraccionistas e que não se perderia muito tempo com julgamentos.
A mulher, portuguesa, foi expulsa de Angola e a sua casa ocupada por um chefe da DISA. “Acabei por vê-lo mais tarde com os meus sapatos calçados”, recorda. Na cadeia, estava sempre à espera do dia em seria chamado para interrogatório. Recorda uma cena de tortura em que esteve amarrado pelos cotovelos por forma a cortar a circulação.
“Durante meses fiquei sem sensibilidade nas mãos”. Ficou preocupado porque “gostava de tocar viola e piano”. Enquanto esteve na cadeia, passava os dias a praticar “exercício físico violento”, diz que não se conseguia “concentrar” em outras actividades como “ler ou jogar xadrez”. Em compensação, à noite, “dormia como um anjo” ao contrário dos colegas.
Em Janeiro de 1978 foi transferido para um “campo de recuperação”. “Foi horrível porque apesar de estar ao ar livre, sem grades, a pressão psicológica era terrível”, diz. Enquanto os restantes presos podiam construir casas (cubatas) ou trabalhar como professores ou médicos, ele andou “sempre com uma enxada na mão” e quando finalmente pôde construir a sua casa, destruíram-na.
Com ironia, refere que enquanto os outros presos construíam cubatas pequenas, sem janelas, porque eram optimistas e pensavam que iam ficar ali pouco tempo, ele construiu uma “verdadeira mansão” onde “podia entrar em pé” e “com janelas que até vidro tinham”. Já no “campo de recuperação”, informaram-no que “teve muita sorte” porque fora inicialmente condenado à pena de morte, depois comutada para 24 anos de cadeia. Nunca foi julgado e saiu ao fim de quase dois anos e meio. Deixou Angola quatro meses depois por se sentir ainda “perseguido”. Nunca mais voltou.
Jorge Fernandes, outro sobrevivente ouvido pela Lusa, teve um percurso semelhante. Foi preso também a 30 de Maio. Lembra os três dias “aterrorizantes” face ao que ouvia na rádio. Ainda recorda a voz forte do locutor: “Agarrem os fraccionistas”. Foi preso na faculdade com “grande pompa” por um “comandante, membro do comité central”. Ironiza que até se sentiu “honrado”.
Levado para o Ministério da Defesa, foi “recebido à bofetada” e ouvia pessoas a serem torturadas. Depois foi transferido para a cadeia, onde estavam “todos aos montes nas celas. “Á noite, quando nos deitávamos não havia espaço por onde andar”.
Só esteve numa cela individual enquanto aguardava pelo interrogatório. Foi torturado e espancado durante um dia e meio. Ainda hoje tem problemas no ouvido esquerdo, consequência da “porrada” que levou. Mesmo assim diz que teve “mais sorte” do que outros colegas que “levavam choques eléctricos e eram queimados com cigarros”. Apesar disso, ainda esteve com uma arma apontada à cabeça. Sentia que uma simples alteração na respiração podia originar o tiro.
A principal preocupação enquanto era espancado foi garantir a segurança dos seus óculos porque é míope. Nunca se partiram.
O que mais “raiva” lhe causou foi ter sido interrogado por colegas de faculdade. “Pessoas que cresceram connosco e assistiam às torturas”, refere.
O episódio que recorda com maior mágoa foi a forma como o informaram da morte do pai, que já estava em Portugal. “Esperaram pelo meu dia de anos para me darem a notícia”. José Fuso também fazia parte deste grupo. Foi detido junto com Jorge Fernandes. Tinha 23 anos e era estudante de economia, “a faculdade onde as discussões políticas eram mais acesas”. Ao mesmo tempo, dava aulas num liceu.
Afirma à Lusa que, dado o “aparato” com que foi preso, pensou que ia ser morto de seguida. Já no Ministério da Defesa, recorda o “terror” que sentiu ao perceber que havia guardas que “nem sequer falavam português” e ao ver que “estavam a queimar livros de Marx”. Nunca foi acusado de nada e diz: “Se cometi algum crime foi o de opinião política”.
Há muitas coisas de que não se lembra, “uma forma de defesa para tentar apagar certas situações que se passaram”. A filha nasceu enquanto esteve preso. Diz que soube o sexo da criança “através de panos cor-de-rosa” que amigos lhe mostraram de fora da cadeia.
Das torturas, recorda que foi “levado para uma sala” e “interrogado enquanto um amigo pessoal estava a ser ameaçado com choques eléctricos nos órgãos genitais”. Ainda tem marcas na cabeça das pancadas que levou.
Foi-lhe dado um caderno da UNICEF para escrever a sua confissão. Durante horas não escreveu nada. A “inspiração” surgiu-lhe depois de levar um pontapé no peito da pessoa que o levou para o MPLA. Escreveu a história desde que entrou no partido pela mão dele. Foi ameaçado de morte, mas a partir desse dia deixaram-no em paz. Ainda hoje não sabe porquê. A sua cela era dentro da casa de banho e a zona para onde escorria a água dos banhos. Estava também ligada aos gabinetes onde decorriam os interrogatórios e ouvia os outros a serem espancados.
Recorda que muitos presos “eram levados à noite, em ambulâncias, que regressavam no dia seguinte, vazias, e sujas de sangue”.
Tal como os colegas, foi transferido para o “campo de recuperação. “Um paraíso” quando comparado com a cadeia. Tínhamos alguma liberdade e tomávamos banho no rio”, conta. Foi libertado a 17 de Agosto de 1979. Nem esperou pelo autocarro que os ira buscar no dia seguinte. Apanhou boleia e foi empilhado com mais oito na parte de trás de uma carrinha durante os 300 quilómetros até Luanda. Guarda “religiosamente” o mandado de soltura. Ironicamente, pagaram- lhe os salários referentes ao período em que esteve preso. Veio para Portugal em 1983 e nunca mais voltou a Angola.
Estes três sobreviventes pretendem formar uma associação e criar um site na Internet para que haja um espaço onde todos os protagonistas desta história possam deixar os seus testemunhos, as suas memórias. Para assinalar a data, este ano, além do habitual almoço de convívio, lançam um apelo aos sobreviventes: “Uma vez mais lembrar, para jamais esquecer”.
Vera Magarreiro
Agência Lusa
É triste saber que coisa com tamanha crueldade algum dia foi feita contra os meus compratiotas angolanas. Sou contra a violencia e contra o regime que ate hoje ainda se vive em angola. Eu acredito que um dia se fara justiça pelo ocorrido sendo que muitos do autores e protagonistas desse mesmo acto se encontrem de saude e todos ricos abuzando ate hoje do direitos do povo angolano…
É triste ler esse relatorio mas garanto-vos q voces ja mas seram esquecidos. As pessoas q vos turutravam enrrequeceram com isso? se calahra devem estar agora nas pracas a ender petroleo. Este e o mal do angolano burro q nem si quer da por canta da sua propria borrisi, este nosso povo ja foi lavado pelo EMPLA e mas este partido vai pagar por tudo q fez e tem feito esta data nunca sera esquecida por aqueles angolanos q reconhesem essa vossa luta. Eu principalmente so um deles. Sempre q voces sentirem trites pelo sucedido pensam sempre q a pessoas q valorizam esta vossa luta 27 de Maio ja mas sera esquecido.
Todos compraram ventos; nem todos sofrearm os malefíciso da tempestade.
è deveras complexa a situação do 27/05/77. Tinha 12 anos quando aconteceu.
Agora com maais de 43, concluí o seguinte:
1. Houve excesso de emoções políticas dos dois ldos da contenda.
2. Nito, não terá avalido estratégicamente o perigo de «insultar» um adversário sem o espionar.
3. Nito não preparou meios humanos (militares) e Bélicos para pôr em marcha com êxito o seu desígnio.
4. Como político (Muito Jovem), nunca invocaria a questão (Branco ou mulato), se os incluisse na sua causa, o mambo pegaria e sem sangue.
5. De qualquer modo, faltou-lhe a calma e ler muitos books de estrategia militar e coordenação com os serviços de inteligência mais eficientes do mundo.
6. Se o golpe pegasse, por qualques desastre, Angola 2 anos mais tarde as Nações Unidas incluiriam como 2º País do Apartheid em Africa.
mais….