Mais um Ano
É comum em qualquer texto que aluda a determinada data, iniciá-lo com a evocação da passagem de mais um ano. Então, e porque de tal molde “mais um” sempre acaba por traduzir soma de angústias e adicionar fragilidade à reflexão, não vou revelar quantidade mas sim conteúdo, ou seja, vou aqui falar das ocorrências e do que se produziu neste intervalo.
O que de mais precioso aconteceu foi sem dúvida a chegada até nós das famílias de muitos dos que desapareceram, especialmente dos filhos. Estes, por não terem sido alvo do efeito dissuasor da repressão da época, não foram forçados, como sucedeu com demais parentes, a protegerem-se no silêncio e na inibição de participar na procura dos seus. Cresceram, interrogaram-se e acabaram por aproximar-se de nós. Indagaram, amofinaram-se, revolveu-se-lhes as entranhas e dispuseram-se a honrar a memória dos seus pais, envolvendo, caso seja, as silenciosas mães, as receosas viúvas.
Para que a procura e aproximação que nos tocou não tenha sido em vão, por parte de quem a nós se chegou, preparámos aqui no site, além daquele onde se biografam os ausentes, outro item – “Recolha de Testemunhos“- que pretende ser o veículo através do qual queremos dar voz a todos aqueles e aquelas que entendam partilhar as suas memórias, ditando-as para uma base de dados que pensamos, quanto mais pormenorizada, factual e extensa, maior valia prestará no futuro.
É pertinente continuar a pugnar pelo direito à procura da verdade e à realização da justiça. Não esmoreçamos e recordemos outras lições noutros lugares do mundo onde a persistência e o empenho colheram, anos passados, os seus frutos.
Também as 13 Teses de Nito Alves foram teimosamente procuradas por muitos dos que nos visitaram. Como nos sucedeu durante anos, a quem barraram o acesso ao seu conteúdo, o fruto proibido acaba por ser o melhor, e é-o por ser proibido. Superou-se esse estorvo e eis que hoje, sem pavor, já se consultam na íntegra as “malvadas” pouco mais que centena e meia de páginas.
Vai estrear-se mais um ano. Que surpresas nos guardará 2007?
Aproximamo-nos vertiginosamente do culminar de 30 lamentáveis anos, e continuamos estoicamente à espera de um sinal, ténue que seja, daqueles detentores de maior informação, que sirva de pedra de toque à criação de uma entidade cuja incumbência já bastamente explanámos e propusemos. Enquanto a intenção não chega adiantemos trabalho.
Vai nascer mais um ano. Nunca é demais repetir quão necessário é lembrar para não esquecer.
José Reis
Fevereiro 2008
“A maturidade, o sentido de estado e o alto grau de responsabilidade e espírito de fraternidade e flexibilidade que os angolanos e as suas instituições atingiram…”
Eu apelo ao espirito de “maturidade” e “responsabilidade” das instituicoes Angolanas. 29 anos de silencio ja chega! A atitude mais responsavel e humana e estabelecer uma comissao de inquerito para apurar os factos dos acontecimentos do dia 27 de Maio. Pelas vitimas , que merecem ser lembradas . Pelas familias, que ate hoje sofrem em silencio e medo.
“…alguns dos seus militantes, que de forma organizada, conduziram uma acção de contestação aos órgãos de direcção do partido e do estado, utilizando componentes de violência com excessos visíveis, que culminaram com a subversão da ordem instituída…”.
Onde estao as provas de tal afirmacao? Ha registos de testemunhos, julgamentos, de condenacoes, de execucoes? Se de facto , isto aconteceu , porque que ate hoje as familias das vitimas nunca receberam esta informacao?
“A reacção a esta acção, levada a cargo pelas competentes instituições para restabelecer a ordem, comportou também exageros, determinados igualmente pela incipiente organização e funcionamento das instituições de zelo dos seus principais agentes.”
Quem foram estes agentes? E porque que nunca foram responsabilizados? Que “exageros” foram cometidos?
“O MPLA acredita estarem reunidas as condições para que os angolanos saibam assumir os seus erros e as suas virtudes, devendo estas prevalecer e ser devidamente reconhecidas.”
Para se assumirem erros e preciso saber o que aconteceu de facto.
( as citacoes sao da DECLARAÇÃO DO BUREAU POLÍTICO DO MPLA SOBRE O 27 DE MAIO – 26 de Maio de 2002 )