A propósito do “27 de Maio de 1977”
“Na vida é impossível renunciar ao passado, à memória. É necessário enfrentá-lo para que os fantasmas do passado não se transformem numa ferida que não cicatriza nunca”
Pedro Almodover
Aproximava-se mais um “27 de Maio”, e enquanto me detinha a escrever estas linhas, andava a Espanha a ferro e fogo, em liça nos tribunais e ruidosos manifestos nas ruas. De um lado estão os vencidos que encaram o desalento como uma das razões que leva à perda da memória histórica, a dolorosa lembrança que os vencedores querem à viva força esconder. Recusam-se os primeiros a baixar os braços, empenham-se em apear os crimes do franquismo do regaço da impunidade, passo que os segundos receiam, não vá a coisa dar para o torto e um juiz mais afoito levar um sobejo de carrascos à barra de um tribunal.
Noutros lados deste mundo, trespassados por infâmia idêntica, sobreviventes e vítimas – de novo os vencidos – não esmoreceram, conseguiram preservar a memória, aguentaram firmes e obtiveram a condenação dos verdugos. O saldo da ditadura argentina conta-se em 30.000 desaparecidos, mas hoje, Jorge Videla, o ex-ditador, cumpre uma pena de prisão efectiva. No Uruguai, os que exerceram cargos maiores durante a ditadura militar (1973-1985), foram condenados pelos seus crimes a mais de 20 anos de prisão.
A tragédia que humilhou Angola no ano de 1977 foi um crime de lesa-humanidade. Suportaram‑se vários anos sob o mais feroz terrorismo de Estado, o regime despótico deixou o país exausto: um número incontável de desaparecidos, fuzilamentos sumários sem julgamento, milhares de jovens abusivamente arrastados para as cadeias, torturados, maltratados física e psicologicamente. Foram anos de medo absoluto e de sofrimento em prisões e campos de concentração, um terror com o qual os carrascos quiseram assegurar a sua própria impunidade. Aos mortos, submetidos aos suplícios mais bárbaros antes de serem aniquilados, foi-lhes destinada por sepultura o fundo do mar ou os lugares recônditos da imensidão do país, outros, a maioria, permanecem esquecidos até hoje em fossas clandestinas, locais de onde, a exemplo do sucedido noutros massacres, deverão ser um dia exumados e restituídos às respectivas famílias. A dimensão desta catástrofe humana é enorme, mas, lamentavelmente, não figura nos inventários dos crimes contra a humanidade. Ou seja, nenhum relatório dos organismos internacionais competentes, refere o que foi a actividade perversa do regime político de Agostinho Neto.
As viúvas dos desaparecidos, por outro lado, sonham com uma certidão de óbito, os familiares desconhecem o paradeiro dos restos mortais dos seus entes queridos, o acesso aos documentos oficiais sequer é autorizado e – pior que tudo – a justiça tarda em chegar. Tudo isto, como é evidente, gera impunidade e dá aos criminosos a certeza de terem saído vitoriosos.
Regresso ao lugar de onde partiu a minha reflexão inicial, volto a Espanha, desta vez para citar o cineasta Pedro Almodover, que vi recentemente expressar o seu repúdio numa avenida de Madrid; “Na vida é impossível renunciar ao passado, à memória. É necessário enfrentá-lo para que os fantasmas do passado não se transformem numa ferida que não cicatriza nunca”
José Reis
Maio de 2010
sou o Celestino, estou muito sentido com o que aconteceo em 27 de Maio de 1977, o presidente da republica ,deve ler esta carta com massima urgencia, purque o que sucedeo, foram tantas geracoes e homem inteligentes quadros da republica.
COMENTÁRIOS A CARTA ABERTA AO PRESIDENTE DE ANGOLA
Admito total ignorância na tragédia ocorrida em Angola no dia 27 maio de 1977, que gerou um banho de sangue com a prisão, sumiço e morte de pessoas envolvidas. Acabei de ler o livro SITA VALLES revolucionária, comunista até a morte de Leonor Figueiredo, que conta um pouco do sofrimento por ela passado, pelos que como ela defenderam os direitos do povo em buscar uma sociedade mais justa. Através da internet busquei saber um pouco mais sobre os fatos ocorridos em Angola e seus personagens, percebi que mesmo prestes a completar 34 anos do banho de sangue conhecido com 27 de maio naquele pais o tema continua a ser um assunto obscuro e a comprovação é o silencio do Exmo. Presidente de Angola José Eduardo dos Santos.
Saber a verdade é primordial e o silêncio acarreta esquecimento. As famílias enlutadas têm o direito de saber o que aconteceu com seus filhos, maridos, mães e amigos. Como diz José Reis, os fatos têm que ser apurados para sustentar a verdade, responsabilizar os infratores, para que enfim possam ser entregue as certidões de óbitos dos mortos, com a publicação do rol dos desaparecidos e a identificação dos locais onde jazem as vitimas.
Os factos devem ser apurados para sabermos a verdade sobre o 27 de Maio.Os carrascos devem ser julgados e condenados por um tribunal internacional.
Respeito sua dor, porém, não deveriam esquecer tambem ressaltar a carnicifina que os nitistas levaram a cabo. perqunto, quem matou saidy mingas, bula, dangeraux, etc. respondam, não desenterrerem o ódio neste momento de paz e reconciliação nacional. Apresemntem propostas de governação. O país não precisa de intriguistas. basta de confusão, a insatisfação não resolve nada. Querem imitar a áfrica do norte. Não é nossa cultura.
Nao sou intriguista, nem tao pouco quero gerar confusao, mas insatisfeito eu estou…
Estarei melhor., e espero viver anos suficientes para ver os governantes do MPLA sentados nos bancos dos reus sobre a carnificina do 27 de Maio. Qual e a nossa cultura? conformismo? PAZ?
Paz com analbetismo, sem educacao, sem saude, sem seguranca social, sem agua, pao,sem sanidade basica, riquezas dubias, ricos e milionarios sem pagar impostos. Esta nao e a minha cultura. Paz em Luanda, New york,London… e entao os angolanos do Muie,Mussuma,Lumbala Nguimbo, Camgombe, e os angolanos do Mandembue meu bairro
de adopcao tem paz?
Se o senhor souber onde estao as valas comuns dos angolanos fuzilados na frente leste,diminuia a minha insatisfacao. Compreendo e pedir muito..
Por acaso, ja entregaram os restos mortais do Dr. Elisiario Vieira Lopes a familia. Paz a tua alma meu grande amigo “Passito”. Foram fuzilados muitos inocentes…